Estudo entregue nesta sexta-feira (1°) ao comitê de crise aponta que manchas de óleo podem estar ‘represadas’ em alto mar e sendo arrastadas por correntes marítimas, podendo chegar a outros estados. Inpe afirma que atua para detectar movimentação e indicar locais com óleo.
Convidado pela Marinha há uma semana para colaborar com as investigações sobre o derramamento de óleo, o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) possui tecnologia que permite estimar o caminho que as manchas de óleo podem percorrer nos próximos dias. Isso abre a possibilidade de tentar contê-lo antes de chegar às praias.
O relatório foi entregue pelo grupo de estudo à Marinha na tarde desta sexta-feira (1°).
Especialista em monitoramento por satélite, o Inpe confirma o que vem sendo dito pelo governo federal, de que não tem sido possível ver por satélite o óleo se deslocando. O oceanógrafo Ronald Buss de Souza, interinamente como vice-diretor do Inpe, afirma que foram checadas as imagens disponíveis – e referentes às áreas mais próximas da costa – e não foram detectadas as manchas. Isso corrobora a ideia de que o deslocamento se dá na subsuperfície.
A partir de agora, o órgão vai fazer um direcionamento específico do satélite CBERS para obter imagens de alto-mar em áreas específicas. Além disso, o núcleo de oceanografia consegue analisar, a partir de dados de ventos e correntes marítimas, para onde o óleo pode estar indo – podendo chegar ao Espírito Santo e ao Rio. “O ponto é que existe mais óleo para vir e podemos mostrar onde está, antes que chegue às praias.”
“A hipótese do Inpe é de que há óleo em oceano aberto e que pode chegar até a costa de outros estados do país, incluindo o sudeste”, disse em entrevista coletiva.
Apesar disso, o oceanógrafo classificou como remota a possibilidade do óleo chegar a São Paulo por causa de características geográficas da costa brasileira.
“A corrente original fica muito mais longe da costa [de São Paulo] do que de Cabo Frio para cima. É uma proteção natural”, explicou.
“Estamos mapeando com o satélite essas áreas predeterminadas e desenhando mapas para que os navios de pesquisa possam ir a esses locais e identificar se há uma massa de óleo e então retirar isso”, explicou.
O primeiro passo foi analisar a imagem que mostrava uma mancha que poderia ser a fonte do óleo. As imagens foram confrontadas por radares e pesquisadores do instituto descobriram se tratar de um aglomerado de algas, e não uma massa de óleo.
Depois disso, eles passaram a estudar o curso do óleo, tendo como base as chegadas ao litoral para tentar chegar a resposta de onde ele poderia estar vindo. Ronald explica que a proporção é mais complexa, porque há possibilidade de que haja muito mais óleo do que se imagina. O resíduo tem chegado em partes separadas em praias do nordeste e em áreas da costa diferentes.
O oceanógrafo explica que isso acontece porque o óleo está em textura plástica, pela ação do tempo, e aglomerado em vórtices – pedaços de água desprendidos da corrente e que giram. Em seu movimento, é como se criassem bolhas de óleo e, em vórtices, caminham de maneira diferente do restante da água.
Para chegar ao resultado eles usaram imagens do Cbers-4 e de outros satélites observando o comportamento da área e das correntes marítimas dos últimos 60 dias.
A resposta, segundo Ronald, é um alerta de que pode haver muito mais óleo represado, mas também trazer uma resposta sobre a forma de conter a chegada das manchas às praias.
O relatório enviado pelo Inpe ao comitê nesta sexta é resultado de um trabalho de uma semana, com o tipo de cooperação que o pesquisador chamou de ‘informal’, por não estarem diretamente ligados ao comitê.
Questionado pela reportagem sobre a possibilidade de um contato tardio com a instituição, uma das referências em monitoramento e pesquisa no país, o pesquisador disse que o governo talvez não reconhecesse a área de oceanografia da instituição como a mais preparada para o caso.
Navio suspeito e multa
A Polícia Federal estima que 2,5 mil toneladas de óleo foram derramados no litoral nordestino. Ainda não se sabe, entretanto, se houve um acidente ou vazamento do navio.
O petroleiro grego suspeito de derramar o óleo que causou o maior desastre ambiental já registrado na costa brasileira se chama Bouboulina. Ele carregou 1 milhão de barris do petróleo tipo Merey 16 cru no Porto de José, na Venezuela, no dia 15 de julho. Zarpou no dia 18 com destino à Malásia.
As informações sobre os detalhes do navio Bouboulina, sua carga e trajetória foram fornecidos pela agência de geointeligência Kpler, a pedido do G1, com base nos dados da Operação Mácula, desencadeada pela Polícia Federal nesta sexta-feira (1º). A embarcação Bouboulina passou a oeste da Paraíba em 28 de julho, segundo um porta-voz da agência.
As investigações do governo brasileiro apontam que a primeira mancha no oceano foi registrada em 29 de julho, a 733 km da costa da Paraíba. As primeiras praias do país afetadas foram no município paraibano de Conde em 30 de agosto.
O navio Bouboulina e a empresa grega dona da embarcação foram citados na decisão judicial que autorizou o pedido de busca e apreensão em escritórios no Rio de Janeiro. De acordo com os investigadores, 2,5 mil toneladas de óleo foram derramadas no oceano.
A proprietária do navio é a Delta Tankers, fundada em 2006, mesmo ano de fabricação do navio. A empresa Delta Tankers declarou que as autoridades brasileiras que investigam o derramamento de petróleo no litoral nordestino não a procuraram, segundo a agência de notícias Reuters.
A Delta Tankers pode ser condenada a pagar multa de até 50 milhões de reais aos órgãos ambientais brasileiros por crime ambiental.
Além disso, pode ter de indenizar todos os trabalhadores afetados pela sujeira, incluindo pescadores e donos de pousadas, de acordo com o prejuízo de cada um, e os governos federal, estaduais e municipais, conforme o gasto que tiveram com a operação de contenção e recolhimento do óleo, segundo advogados consultados pelo jornal O Estado de S. Paulo.
O valor total que pode ser cobrado da empresa, portanto, ainda é impossível de calcular, porque os prejuízos vêm aumentando. “Esse tipo de acidente envolve tanto o Direito Ambiental como o Direito Marítimo, cujas regras acabam se entrelaçando, e o foco principal é o prejuízo ambiental. Os processos devem tramitar na Justiça Federal, e cabe à empresa acusada a responsabilidade de provar que não foi ela.”
“Claro que a investigação precisa apontar algum nexo causal, como por exemplo a constatação de que esse navio foi o único que transportava petróleo e passou pela região atingida, em datas compatíveis. Apontada essa ligação, o ônus da prova passa aos acusados, a quem caberá demonstrar que não foram eles os responsáveis pelo acidente”, afirma Flávia Limmer, professora de Direito Ambiental e Direito do Petróleo da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-RJ).