Menina que morreu castigada com jejum pediu para ser alimentada e mãe negou

Segundo polícia, em depoimento ela confessou que quando filha pediu comida, disse que era para que criança bebesse água ao sentir fome. Mãe disse à polícia que está arrependida. Padrasto acreditava que jejum purificava e obrigava a garota e irmão a praticar, segundo delegado.

Por G1 e R7.

Menina que morreu por desnutrição por ser punida com jejum em Ubatuba era obrigada a dormir no chão, segundo polícia — Foto: Arquivo pessoal

Uma menina de 11 anos que morreu por desnutrição decorrente de um jejum em Ubatuba (SP). Ela chegou a pedir para ser alimentada por se sentir fraca e teve o pedido negado pela mãe, segundo a Polícia Civil. Em depoimento, segundo o delegado, a mãe teria mandado que ela tomasse água quando a menina reclamou por sentir fome.

A mulher e o padrasto da criança foram presos na sexta-feira (25) e, segundo a polícia, ela disse que está arrependida. Já o homem, permaneceu a maior parte do tempo em silêncio. Eles vão responder por tortura com morte, cárcere privado e abandono intelectual.

De acordo com o delegado Ricardo Mamede, a prática de jejum era uma imposição do padrasto, que aplicava a medida como punição à garota e ao irmão dela, de 8 anos.

“O padrasto tem convicções religiosas, mas não é ligado a nenhuma religião. Ele segue um criador, que diz ser Deus e, na cabeça dele, o salvamento das pessoas só acontece através de jejum. Quando as crianças desrespeitavam, ele aplicava castigos de jejum, que começavam com uma refeição, passava para duas e ia aumentando, até chegar nessa vez que durou dias”, disse.

O jejum de dois dias que causou a morte da criança por desnutrição proteica calórica foi imposto como um castigo por ela ter mentido, segundo o delegado. “No jejum anterior ela ficou pedindo para comer. Quando reclamava de fome, diziam para ela tomar água. Ela disse que tomou água quando foi questionada e por ter mentido que tomou água, elas a puniram”, disse.

A mãe, de 26 anos, e o padrasto, de 47, vão passar por uma audiência de custódia no início da tarde deste sábado (26). O irmão da vítima foi encaminhado para um abrigo da cidade e está sob os cuidados do Conselho Tutelar.

O corpo da menina foi enterrado no cemitério municipal de Pindamonhangaba na manhã deste sábado.



Histórico

A polícia foi acionada pelo hospital após os suspeitos levarem a garota ao pronto socorro, por volta das 21h de quinta-feira (24). A polícia trabalha com a informação de que a menina chegou ao hospital já morta e que os médicos atestaram desnutrição e palidez.

A mãe e o padrasto foram presos em flagrante. Em depoimento nesta sexta a mulher confessou, segundo a polícia, que mantinha a menina em cárcere privado. De acordo com o relato, ela ficava no chão sobre um tapete de EVA (um tipo de borracha) no apartamento da família, no Centro da cidade.

Ela disse que a vítima ficou trancada em casa durante cinco meses e que era obrigada a jejuar e orar como forma de corrigir e castigar por atos considerados errados, como mentiras. Durante esse período, ela teria saído apenas duas vezes na rua. O irmão dela também era submetido a castigos esporádicos

Segundo a polícia, na última terça-feira (22) a mulher e o marido teriam obrigado a menina a começar o jejum de dois dias. Na quinta, a criança passou mal e morreu no hospital. Eles foram presos no IML da cidade.

Criança deu entrada na Santa Casa, no última quarta-feira (24), mas não resistiu
Reprodução Google Street View

Diário

A Polícia Civil apreendeu um diário no qual a menina de 11 anos que morreu por desnutrição decorrente de um jejum relatava a rotina de orações e exercícios físicos. O caderno com as anotações foi apreendido no apartamento em que ela morava com a mãe, o padrasto e o irmão de 8 anos no Centro de Ubatuba (SP). O conteúdo em detalhes não foi revelado pela polícia e será usado durante a investigação.

“Com as buscas, encontramos o diário relatando a rotina, que era jejuar, orar e fazer exercícios frequentes. Flexão, abdominal e mesmo sem alimento, ela era obrigada a fazer exercícios”, disse o delegado.

Segundo a polícia, em um outro caderno também apreendido no apartamento, o casal escreveu a justificativa que daria às autoridades.

A mãe e o padrasto pretendiam mentir, segundo a polícia, que a menina tinha anemia e teria morrido por falha dos médicos no hospital. A polícia trabalha com a informação de que a menina chegou ao hospital já morta e que os médicos atestaram desnutrição e palidez.

“[em depoimento] O padrasto continuou afirmando que ela teria falecido em virtude de anemia e não se culpava por aquilo e afirma até hoje que faria de novo. Que ele acredita que a purificação só venha através de jejum. Mas a mãe, após ser confrontada com todas essas provas, ela decidiu revelar a verdade e contou detalhadamente tudo”, disse o delegado.



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