Intelectuais das maiores universidades do mundo assinam manifesto contra cortes de verbas para Ciências Humanas no Brasil

Estudiosos de instituições como Harvard, Princeton, Sorbonne se posicionam contra eventual redução de verbas para Ciências Humanas no Brasil.

Fontes: O Globo; Revista Fórum.

Milhares de intelectuais e acadêmicos de universidades de todo o mundo assinaram nesta segunda-feira um manifesto contra a eventual redução de recursos para as faculdades de Filosofia e Sociologia. O texto foi uma resposta de pesquisadores e intelectuais à defesa de cortes na área das Ciências Humanas feita pelo presidente Jair Bolsonaro na última semana.

Há na lista intelectuais de Harvard, Princeton, Yale, Oxford, Cambridge, Berkeley, e de instituições brasileiras como a Universidade de São Paulo (USP), Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Universidade de Brasília (UnB), entre outras.

O manifesto, publicado nesta segunda no francês “Le Monde”, foi organizado pela Gender International, uma rede de pesquisadores de estudos de gênero e sexualidade que, como se descreve, “mobiliza-se contra a cruzada da chamada ideologia de gênero”.

Entre os membros da organização, estão a filósofa e escritora americana Judith Butler , doutora em Yale e professora da Universidade Berkeley (California),  os sociólogos Éric Fassin, professor de Ciências Políticas da Universidade Paris 8, e David Paternotte, da Universidade de Bruxelas.

No texto, os 1.100 signatários citam diretamente o presidente do Brasil, lembrando a declaração de Bolsonaro no Twitter segundo a qual o Ministério da Educação estuda descentralizar investimento em faculdades de filosofia e sociologia (humanas). O objetivo é focar em áreas que gerem retorno imediato ao contribuinte, como: veterinária, engenharia e medicina”.

“A função do governo é respeitar o dinheiro do contribuinte, ensinando para os jovens a leitura, escrita e a fazer conta e depois um ofício que gere renda para a pessoa e bem-estar para a família, que melhore a sociedade em sua volta”— Jair M. Bolsonaro (@jairbolsonaro) 26 de abril de 2019.

O manifesto defende que “nas nossas sociedades democráticas, os políticos não devem decidir o que é a boa ou a má ciência. A avaliação do conhecimento e de sua utilidade não pode ser conduzida de modo a conformar- se com as ideologias de quem está no poder”.

O abaixo-assinado afirma ainda que “as ciências sociais e as humanidades não são um luxo”. O texto segue: “Pensar sobre o mundo e compreender nossas sociedades não deve ser privilégio dos mais ricos. Como acadêmicos dos mais diversos campos, estamos plenamente convencidos de que nossas sociedades, incluindo o Brasil, precisam de mais, e não menos educação”.

É o segundo manifesto com este teor da Gender International. A rede já havia se manifestado ante outro caso que considerou um ataque contra as Ciências Humanas — na Hungria, em meados do ano passado, quando o presidente Viktor Orbán proibiu estudos de gêneros nas universidades do país.


O presidente Jair Bolsonaro na posse do ministro da Educação, Abraham Weintraub Foto: Jorge William/09-04-2019

Vejam abaixo a íntegra do abaixo-assinado organizado PELA “Gender International”:

“No dia 29 de abril de 2019, o presidente da República do Brasil, Jair Bolsonaro, confirmou por Twitter o que no dia anterior já havia anunciado o Ministro da Educação, Abraham Weintraub: seu governo planeja reduzir o financiamento federal para programas acadêmicos em sociologia e filosofia. Segundo eles, nesses campos, futuros estudantes terão que pagar por sua própria formação. Enquanto o Ministro afirmava que sua proposta havia sido orientada por medidas tomadas no Japão em 2015, o Presidente insistia que a educação deve se concentrar na leitura, na redação e na aritmética e que, em lugar dos cursos na área de humanidades, o Estado deve investir nas áreas que tragam retornos imediatos para quem paga impostos, tais como veterinária, engenharia e medicina.

Nós, signatários dessa declaração, fazemos um alerta quanto às sérias consequências de tais medidas que, inclusive, levaram o governo do Japão a recuar de suas propostas depois de um amplo protesto nacional e internacional. Em primeiro lugar, por que a educação em geral e a educação superior, em particular, não trazem retornos imediatos; constituem um investimento no futuro das novas gerações. Segundo, as economias modernas não exigem apenas técnicos especializados; nossas sociedades precisam de cidadãs e cidadãos que tenham uma formação ampla e geral. Terceiro, nas nossas sociedades democráticas, os políticos não devem decidir o que é a boa ou a má ciência. A avaliação do conhecimento e de sua utilidade não pode ser conduzida de modo a conformar- se com as ideologias de quem está no poder.

As ciências sociais e as humanidades não são um luxo; pensar sobre o mundo e compreender nossas sociedades não devem ser privilégio dos mais ricos. Como acadêmicos dos mais diversos campos, estamos plenamente convencidos que nossas sociedades, incluindo o Brasil, precisam de mais e não menos educação. A inteligência coletiva é tanto um recurso econômico quanto um valor democrático”.

Num outro manifesto , divulgado nesta segunda-feira pela coluna Ancelmo Gois, também foi criado como uma resposta às mesmas declarações de Bolsonaro. Com mais de 13 mil assinaturas, o documento foi capitaneado por sociólogos da Universidade Harvard e já é endossado por intelectuais da área de todo o mundo. A leitura da íntegra do manifesto (em inglês) pode ser feita aqui .

“Nós nos opomos à tentativa do presidente Bolsonaro de desinvestir na sociologia, ou qualquer outro programa nas Ciências Humanas ou Sociais”, diz o texto. “Como sociólogos históricos e contemporâneos, entendemos que a mercantilização do ensino superior convenceu muitos políticos — no Brasil, nos Estados Unidos e no mundo — de que uma educação universitária é valiosa apenas na medida em que é imediatamente lucrativa. Nós rejeitamos essa premissa”, acrescenta o abaixo-assinado.



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