Exportadora colombiana de cannabis investe 25 milhões de euros em Portugal

Colombiana Clever Leaves abriu porta dos EUA para exportação de cannabis a partir de Portugal, onde os investimentos da empresa vão totalizar 25 milhões de euros no final deste ano.

Com informações de Dinheiro Vivo.

Clever Leaves controla 10 mil metros2 de cultivo em estufa, com espaço para crescer até aos 25 mil m2 em São Teotónio, Odemira © D.R

O mercado da cannabis medicinal está numa nova fase de expansão, em Portugal. O país já contava com, pelo menos, cinco empresas a cultivar, secar, cortar e embalar cannabis, desde a legalização do uso para fins medicinais deste tipo de planta, em 2019. Agora, o mercado nacional subiu um patamar, depois da colombiana Clever Leaves anunciar que começou, este mês, a exportar flor seca de cannabis de Portugal para os EUA, o maior mercado do mundo de uso medicinal e investigação científica de cannabis. O primeiro lote de 30 quilos já seguiu para a Biopharmaceutical Research Company, empresa farmacêutica com quem foi fechado o acordo de exportação.

“É importante reconhecer que a Clever Leaves abriu uma porta, alcançando um tremendo objetivo para as empresas que estão no negócio da cannabis para fins medicinais, em Portugal”, afirma Kyle Detwiler, CEO da Clever Leaves, em entrevista ao Dinheiro Vivo.

Está em causa, realça o gestor, o primeiro acordo de exportação a ser feito para os EUA, “abrindo potencialmente caminho para novas rotas comerciais” para a indústria mundial de cannabis medicinal, mostrando que é possível cumprir os “apertados e exigentes” critérios do regulador norte-americano da área. “Não me lembro de alguém ter exportado comercialmente cannabis para os EUA”, diz.

Mas se o feito da empresa colombiana é assinalável, também a importância de Portugal para isso é de notar. Para Kyle Detwiler, Portugal não só dá condições para a produção eficiente e em larga escala de cannabis, como tem um “enquadramento” que permite acordos de exportação como o conseguido nos EUA. E o gestor não deixa de notar isso no caso da Clever Leaves, cujo negócio global prospera com a ajuda de Portugal. “Assim é, que no final deste ano, quando concluirmos um plano de expansão [incluindo áreas de cultivo, a instalação de uma unidade de pós-colheita de cannabis no Parque Empresarial da Península de Setúbal e este acordo de exportação], teremos investido cerca de 25 milhões de euros em Portugal”, revela.

Portugal à frente da Colômbia

O investimento canalizado para Portugal é assinalável, tendo em conta que a multinacional de origem colombiana está no país apenas há dois anos, tendo instalado em São Teotónio, concelho de Odemira, o primeiro centro de produção de flor seca de cannabis da empresa na Europa. Então, qual a importância do país? “Portugal representa um projeto que começámos em 2019.

Identificamos na Europa mercados atrativos na Grécia, Alemanha, Macedónia, Reino Unido e Holanda, mas sentimos que Portugal tinha o balanço perfeito que procurávamos”, adianta.

O CEO da Clever Leaves explica que o país, além das condições climáticas, tem “estabilidade, legislação produzida na área e mão de obra com forte experiência de trabalho na indústria da horticultura”. Acresce, agora, a possibilidade de exportar para o maior mercado de cannabis para fins medicinais do mundo. “Para lá dos euros, Portugal é importante porque permite-nos fazer o que anunciámos há dias: exportar flor seca de cannabis, rica em THC, o que não é permitido fazer a partir da Colômbia”, sublinha.

A Colômbia, que lida há décadas com o estigma do narcotráfico, e embora procure entrar no pelotão da frente da indústria da cannabis para fins medicinais, avançou com regras para esse mercado em 2016, permitindo apenas a exportação do produto extraído da planta. Só em julho deste ano foi decretada a permissão para empresas do setor exportarem flor seca de cannabis.

Kyler Detwiler afirma que o setor ainda aguarda pelos “regulamentos subsequentes” para perceber exatamente o que as empresas podem fazer. Já em Portugal é possível extrair o produto da planta e produzir, importar e exportar a flor seca de cannabis, desde 2020.

Assim, segundo o CEO da empresa colombiana, o negócio da Clever Leaves tem propósitos diferentes na Colômbia e em Portugal. Na Colômbia, a operação foca-se na extração de produto da planta, enquanto, em Portugal, o foco incide na produção de flor de cannabis, com o objetivo de exportar para farmacêuticas.

Perfil da cannabis estudado em Portugal

Acresce ao foco do negócio um trabalho de análise científica, que está a ser feito também em Portugal. Quando a empresa entrou no país realizou uma análise agronómica do território nacional, identificando tipos de solo, níveis de precipitação e a disponibilidade hídrica – dados, agora, cruzados com informação sobre “centenas, se não milhares de variedades e estirpes” de flores de cannabis de diferentes composições químicas.

A Clever Leaves “está focada na identificação de variedades que possuam as melhores e mais desejadas composições de canabinoides, que, provavelmente, terão mais eficácia médica”. Se a empresa for bem sucedida a identificar o perfil genético das plantas e dos canabinoides poderá alcançar melhores estirpes, adaptando operações para produzir esses tipos de cannabis, segundo o CEO da empresa.

Infarmed alcança “balanço perfeito”

O mercado da cannabis para fins medicinais, em Portugal, está em crescimento, mas ainda é recente. Por isso, ainda há que lidar com os preconceitos associados à cannabis. Nesse ponto, Kyle Detwiler nota que é muito importante ter um regulador forte. “Cada sociedade, quando aborda a legalização da cannabis, é muito cautelosa. E a experiência portuguesa com a cannabis não é diferente”, diz o gestor, elogiando o papel do Infarmed, que regula o negócio para fins medicinais, em Portugal. “O Infarmed está a conseguir o balanço perfeito: uma regulamentação muito focada, altos padrões de regulação, uma ação direta. Caso contrário, abrir-se-iam as portas e até surgiriam produções de cannabis no meio de Lisboa”.

“O regulador tem uma abordagem muito disciplinada, penso que essa é o passo correto a ter”, acrescenta.

A Clever Leaves é uma das grandes empresas de comercialização de cannabis para fins medicinais. Com operações nos EUA, Canadá, Colômbia e Alemanha, a Clever Leaves tem em Portugal uma propriedade de 84 hectares em São Teotónio, que corresponde a cerca de dez mil metros quadrados de estufas, com capacidade para crescer ainda para os 25 mil metros quadrados. “Estamos agora a expandir a nossa área de cultivo, uma expansão que ficará completa no final do ano”, diz o gestor.

A empresa também vai instalar uma nova unidade de pós-colheita de cannabis medicinal no BlueBiz – Parque Empresarial da Península de Setúbal, onde será feita feita a secagem, o corte e embalagem da flor de cannabis, criando mais 25 postos de trabalho, este ano.

A operação global da Clever Leaves emprega cerca de 500 pessoas – 60 em Portugal, a que acrescem mais 40 trabalhadores temporários. “Portugal representa um investimento muito importante para nós”, conclui o CEO da Clever Leaves.



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