Para ativação do tratado herdado da Guerra Fria e assinado no Rio de Janeiro é preciso a aprovação dos 19 países participantes
Fontes: Exame; Carta Capital.
Os Estados Unidos acionaram, na madrugada desta quinta-feira 12/09, o Tratado Interamericano de Assistência Recíproca (Tiar), diante dos exercícios militares considerados “ameaçadores” por parte do governo venezuelano de Nicolás Maduro na fronteira com a Colômbia, e depois de uma convocação da OEA a seus chanceleres. O mecanismo pode resultar em medidas como o emprego de forças armadas.
O TIAR é um texto herdado da Guerra Fria e assinado em 1947 no Rio de Janeiro, que prevê de maneira comparável ao artigo 5 do tratado fundador da OTAN uma assistência mútua em caso de ataque militar lançado do exterior contra uma das partes do acordo.
A Venezuela abandonou o Tiar há seis anos, mas em julho passado a Assembleia Nacional venezuelana – liderada por Guaidó – aprovou o regresso ao tratado. Também conhecido como “Tratado do Rio” por sua adoção na capital fluminense, em 1947, os países membros podem optar por medidas que vão da ruptura das relações diplomáticas ao emprego de forças armadas.
Colômbia e Venezuela compartilham uma fronteira de 2.200 quilômetros, onde Maduro ordenou exercícios militares até 28 de setembro com a mobilização de 150.000 agentes e um sistema de mísseis ante supostas ameaças de Bogotá em um cenário de tensão entre os países, que em fevereiro romperam as relações.
“Recentes movimentos belicosos de mobilização na fronteira com a Colômbia por parte de militares venezuelanos, assim como a presença de grupos ilegais armados e organizações terroristas no território venezuelano, demonstram que Nicolás Maduro não é apenas uma ameaça ao povo venezuelano, suas ações também ameaçam a paz e a segurança dos vizinhos da Venezuela”, declarou o secretário americano de Estado Mike Pompeo, ao ativar o Tiar.
Segundo ele, foi o líder opositor Juan Guaidó – reconhecido como presidente interino por mais de 50 países – quem solicitou o acionamento do Tiar.
Manobras militares na fronteira
Colômbia e Venezuela romperam relações diplomáticas em fevereiro deste ano, desde que Bogotá anunciou que reconhecia Guaidó como presidente interino da Venezuela. No final de agosto, o presidente colombiano, Iván Duque, acusou o governo Maduro de “abrigar” e “apoiar” dissidentes da extinta guerrilha das Farc. As afirmações levaram o líder chavista a ordenar manobras militares na fronteira comum de 2.200 km entre a Venezuela e a Colômbia até o final de setembro, além da mobilização do sistema de mísseis terrestres e antiaéreos venezuelanos.
Na quarta-feira 11/09, a sessão do Conselho Permanente da Organização dos Estados Americanos (OEA) convocou os 19 países signatários do tratado para uma reunião a partir da próxima semana com o objetivo de discutir o “impacto desestabilizador” da crise na Venezuela. Durante a sessão, Estados Unidos, Brasil, Argentina, Colômbia, El Salvador, Guatemala, Haiti, Honduras, Paraguai, República Dominicana e a própria Venezuela, através do representante de Guaidó, votaram por ativar o órgão de consulta do Tiar no Conselho Permanente da Organização dos Estados Americanos (OEA). O presidente da Colômbia, Iván Duque, recusou qualquer possibilidade de diálogo com Maduro para reduzir a tensão na fronteira, alegando ser impossível negociar com quem rejeita a democracia. “Quando você dialoga é para aproximar posições e buscar pontos de acordo, mas somos um país que defende a democracia (…) e Nicolás Maduro é inimigo da democracia”.
Durante a sessão do Conselho Permanente, o chanceler da Colômbia, Carlos Holmes Trujillo, denunciou o apoio de Nicolás Maduro à guerrilha colombiana do Exército de Libertação Nacional (ELN) e a ex-combatentes da extinta Farc (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia). O chanceler colombiano também pediu à comunidade internacional o emprego de todos os instrumentos ao seu alcance “para combater eficazmente o terrorismo”. Segundo ele, a “proteção” do “regime ditatorial” de Maduro ao ELN e a grupos armados residuais colombianos “narcoterroristas” gera novos elementos de insegurança à paz e à estabilidade na região.
Duque garantiu que seguirá denunciando junto aos organismos internacionais a presença de “terroristas colombianos na Venezuela”. “A Colômbia mantém sua posição porque nós não estamos agredindo ninguém, não estamos fazendo provocações de caráter militar”, ressaltou.
“Influência desestabilizadora”
Pompeo disse que a invocação do TIAR é “o reconhecimento da cada vez mais desestabilizadora influência” do governo de Maduro na região.
“As políticas econômicas catastróficas e a repressão política continuam alimentando uma crise de refugiados sem precedentes, esgotando a capacidade dos governos para responder”.
De acordo com a ONU, 3,6 milhões de venezuelanos abandonaram o país desde 2016 em consequência da grave crise econômica.
“Esperamos mais discussões de alto nível com os integrantes do TIAR para abordar coletivamente a urgente crise dentro da Venezuela, que se espalha por suas fronteiras, e considerar opções econômicas e políticas multilaterais”, destacou o secretário de Estado.
Segundo o TIAR, também conhecido como Tratado do Rio por sua adoção nesta cidade em 1947, os países membros podem optar por medidas que vão da ruptura das relações diplomáticas ao emprego da força armada.
Washington celebrou a decisão como um apoio aos esforços de Guaidó para retirar Maduro do poder e convocar novas eleições.
Na sessão, EUA, Brasil, Argentina, Colômbia, El Salvador, Guatemala, Haiti, Honduras, Paraguai, República Dominicana e a própria Venezuela, com o representante de Guaidó, votaram a favor de ativar o órgão de consulta do TIAR.
Costa Rica, Panamá, Peru, Trinidad e Tobago e Uruguai optaram pela abstenção, enquanto Bahamas e Cuba – membro não ativo da OEA que nunca se retirou do TIAR – não compareceram à sessão.
A Costa Rica tentou sem sucesso a aprovação de uma emenda à resolução para excluir o uso da força armada como alternativa, enquanto o Uruguai afirmou que a situação na Venezuela não permite a ativação do tratado.
Luz Baños, embaixadora do México – país que, assim como Bolívia, Equador e Nicarágua, abandonou o TIAR nos últimos anos – lamentou a “perigosa aproximação de um ponto sem retorno”.
A Venezuela abandonou o TIAR há seis anos, mas em julho a Assembleia Nacional venezuelana – liderada por Guaidó – aprovou o regresso ao tratado, decisão que foi anulada pelo Supremo Tribunal do país.
Apesar das sanções econômicas impostas pelo governo dos Estados Unidos à Venezuela e seus dirigentes, Maduro, que tem o respaldo das Forças Armadas, assim como o apoio da Rússia e da China, conseguiu permanecer no poder.